2011/06/06

Azul

Três mulheres conversavam ruidosamente sobre a mesa do café, dedos esguios de unhas azuis, torcendo pacotinhos de açúcar vazios. Eram três mulheres e falavam na pausa do almoço, depois de terem comido mini pratos de arroz de pato e bacalhau com natas. Estavam sentadas numa mesa ao lado do balcão dos salgados. Da cozinha, chegava um cheiro denso de gordura saturada que se entranhava nos cabelos e nos tecidos. Um empregado, esguio, acelerava o serviço com gritos. De vez em quando, pelo canto do olho, enquanto esperava algum pedido, olhava o trio. A primeira mulher era bonita, de olhos rasgados e lábios grossos, uma beleza intensa, mas levemente ordinária que apetecia esmagar, lamber, magoar. Tinha as unhas pintadas de azul-turquesa. A segunda mulher era tão bonita como a primeira, mas de um modo diferente. A sua beleza era distante, intangível, virgem, como a de uma santa numa peanha. Trazia as unhas pintadas de azul metalizado. A terceira mulher era a mais bonita porque a sua beleza era, ao mesmo tempo, distante e próxima. Qualquer homem que a olhasse, assim sentada, torcendo um pacotinho de açúcar, sentir-se-ia inquieto por não saber como a classificar. Santa ou puta? Era essa inquietação, esse mistério, que a tornava única e, por isso, mais intensa a sua beleza. A terceira mulher trazia as unhas pintada de azul tempestade. O empregado do balcão dos salgados, porém, parecia não se interessar pela beleza das três mulheres. Dir-se-ia, pelo modo como as olhava, fixando-se nas mãos torcendo pacotinhos de açúcar vazio, apenas estar fascinado pela cor das suas unhas.

(gosto de segundas-feiras e não gosto nada de azul.)