Entrou no salão. O dono do cabeleireiro
veio recebê-la. Cumprimentou-a com um beijinho e ofereceu-lhe um chá. Aninhas
recusou com delicadeza e deixou-se estar a falar junto do balcão da entrada. O
dono era um homem gordo, muito expansivo, cuja afectação se justificava pela
clientela que conseguira reunir ao longo dos anos: jornalistas, deputadas, uma
ou outra ministra, escritoras, professoras universitárias, algumas actrizes
consagradas, mas nem uma única dessas celebridades que aparecem nas capas de
revista por confundir a sua profissão com meretrício. Aninhas perguntou-lhe
pelo companheiro, operado há pouco tempo. Não o fazia com sinceridade, não era
genuína a sua preocupação. Na verdade, sentia certa repulsa quando via o dono
do cabeleireiro abraçar o namorado, um rapaz novo que trabalhava no salão como
colorista. Sacrificava, porém, o seu conservadorismo ao estatuto que aquela
aparente intimidade lhe conferia. O salão tinha uma clientela muito selecta. No
entanto, apenas um círculo muito restrito, a que Aninhas pertencia, tinha
direito ao convite para o chá, servido numa porcelana finíssima, quase
transparente.