Hoje,
à hora do almoço, deitei-me com um homem e lambi-o. Não gostei do homem nem do
sabor do seu suor, asséptico, com um ligeiro travo a bolor e medicamento. Na
casa de banho, enquanto me arranjava, bochechei a boca com água e cuspi. Como se estivesse no dentista. Ao olhar-me no espelho,
lembrei-me da rosa do deserto que a Cilinha, minha madrinha, costumava guardar
na cómoda do seu quarto. Feita de areia e sal, de uma cor muito bonita, misteriosa,
foi objecto que durante anos exerceu sobre mim um fascínio muito grande. Sempre que
visitava os meus padrinhos no apartamento de Benfica, corria ao quarto deles,
procurava a rosa do deserto e ficava a olhá-la. Depois encostava a flor de
pedra à boca para sentir nos lábios o sabor do deserto. Hoje, ao olhar-me no espelho, depois
de lamber a pele de outro homem, percebi finalmente ao que sabe o teu corpo: ao
sal do deserto.