2016/11/09

Tango



( O que em mim terá efeito? O que me fará acordar deste torpor, desta angústia tão antiga, desta podridão? Nada me interessa. Ninguém me interessa. Finjo. Sou uma extraordinária fingidora. Leio e finjo. Como e finjo. Afago o rosto da minha filha e finjo. Falo com o Sr. Tobias pela manhã, pergunto pela pescaria do fim-de-semana, e finjo. Irrito-me com a mulher que chama "pretinho" ao engenheiro informático e finjo. Imagino-me nas termas da Cúria, hotel antigo, portas de ferro e, nos quartos cheios de luz, a presença de um tempo antigo. Já não finjo. Um parque de magnólias floridas, a sala de jantar quase vazia, eu, sentada a uma mesa, envelhecendo num segundo, eu, com o rosto vincado de rugas, o cabelo branco, abreviando o meu sofrimento, a beber um copo de vinho, sem pensar em nada, a olhar para a jovem flautista de longos cabelos lisos.)