Mastigo o bolinho de amêndoa em frente da montra da loja de produtos religiosos. Cristos, beatos, santinhas de pés descalços, a grande virgem mãe de olhar manso ao meio. É feia, tem olhos bovinos, pés que lembram barbatanas. Não gosto da virgem mãe. A sua virtude e a sua abnegação aborrecem-me. Não me seduzem. É na ruína, na desordem, no pecado que me sinto viva. É bom ser pecadora. No meio do caos e das sombras respiro melhor. Meto o resto do bolinho de amêndoa na boca. Olho o meu reflexo no vidro. Ajeito o cabelo, encolho a barriga. Atravesso a rua e entro na igreja.