2007/12/01

Minotauro

Vão andar descalços pelo quintal. Comer com as mãos. Aprender a fazer bolinhas de arroz e metê-las à boca depois de mergulhadas em molhos de mil cores. Vão ver os cogumelos gigantes do espaço para cerimónias, casamentos e baptizados, Royal Paradise é como se chama, do primo Franky. Vão assistir à missa em concanim, espreitar as pulseiras de ouro das mulheres e os cabelos perfumados de jasmim. Vão conhecer a fábrica de gelo. Vão procurar o minotauro no mercado de Margão e fugir das matilhas de cães sarnosos que rondam a cidade. Vão meter os pés nos arrozais, onde há cobras e outros bichos. Vão descobrir que os macacos se sentam nos galhos do tamarindo e observam a tia Quitéria enquanto as suas mãos esguias de pianista escolhem os bagos de arroz. Vão subir à torre da Kanchanganga e dar de comer às gralhas que todos os dias vêm cumprimentar as irmãs mais bonitas de Bombaim. Lara e Elaine Noronha. Vão percorrer as ruas da cidade e tocar os cristos que vivem nas bermas. Vão estranhar os cheiros, a sujidade, a miséria. Ela não desaparece por não a olharmos. Vão mergulhar os corpos pequeninos na praia de colva onde não há turistas sauditas, nem turistas russos, só indianos passeando de mãos dadas e indianas que mergulham nas águas do Índico de sari. E um carrossel muito velho, onde peixes gigantes, de sorrisos assustadores, embalam meninos que trazem as mãos cheias de vento.

(Em breve, volto à Índia. Desta vez levo os miúdos. E se eles não gostarem? Vai ser terrível porque se os meus filhos não gostarem da Índia eu vou passar a gostar um bocadinho menos deles.)