2011/10/06

Poliedro

O homem diz que me vejo como um deserto. Vazia de tudo, crio miragens para me iludir, que engano os outros, falsificando-me. Ele a falar, eu a fugir-lhe, a fixar-me na jarra com hera que está em cima da secretária, a sentir-me de pechisbeque, feita de ouro falso, um halo dourado por fora, uma liga qualquer esverdeada, com cor de bolor, de humidade, por dentro. Remata, dizendo, que tenho uma personalidade caleidoscópica, que se multiplica, adequa, desvirtua com o intuito de se esconder. Utiliza outra palavra. Prismática. Enquanto ele fala penso numa palavra de que gosto muito. Poliedro. Termino cansada, corpo dorido, como se me tivessem dado uma sova. Quero fugir lá para fora, ver os melros e as prostitutas, feias e gordas, que se exibem no crepúsculo lilás do parque. Olhar para fora. Para não olhar para dentro.