2015/12/04

Rapaz

A mulher parece um pombo: patas finas, plumagem cinzenta, peito insuflado. Cada vez que grita, chamando nomes ao árbitro, olha em redor, cheia de satisfação. A sua raiva incontida, primitiva e boçal, diverte-me mais do que me incomoda. Já o árbitro, lá em baixo, de olhar plácido, não consegue disfarçar o desconforto. Os seus gestos são tensos, parece um animalzinho ofuscado pela luz, hesita antes de erguer o braço para mostrar um cartão vermelho. Presto atenção ao jogo. Sigo movimentações, passes, remates. O Joaquim está sentado ao meu colo, a Dá encosta-se a mim e, assim, colada ao meu corpo, vai tirando fotografias. Beijo um, depois outro. Cheiro um, depois outro. Atento no chiar dos ténis dos jogadores no chão encerado do pavilhão. É um ruído estranho. Ouve-se uma buzina a marcar o fim da primeira parte. O João olha disfarçadamente para a bancada à nossa procura. Há muito tempo que não vínhamos assistir a um dos seus jogos. Acenamos-lhe. Mandamos beijinhos repenicados, gritamos o seu nome. Fingindo arrelia, o meu rapaz sorri.