2006/11/30

P-U-T-A

O João entra no quarto da irmã com o dicionário na mão. “A Julieta comeu a capa do meu dicionário!” Olho horrorizada para as suas mãos. “Mãe, sabes que o dicionário tem asneiras?” diz enquanto me entrega o livro para as mãos e trepa para a cama da Madalena. Indigno-me. “Tem, tem!”, insiste o menino maravilha. “Vai lá ao f e procura filho da p-u-t-a.” Procuro. Lá está. Filho da puta, escarrapachado, escrito com todas as letras no dicionário do meu filho. Ele cabriola. Ri-se às gargalhadas perante a minha estupefacção. A irmã aos gritos, já lacrimosa, pergunta-me o que é um filho da puta. Mal adormecem, corro a resgatar o dicionário. Investigo. O dicionário da porto editora, o pequenino, azul, o tal que no meu tempo apenas tinha a palavra cabrão (definida como bode grande), tem, pelo menos, as seguintes palavras: merda, filho da puta, cona, caralho, cabrão, foda-se, fodido e foder. Verdade, verdadinha. Ao olhar o dicionário do João, meio comido pela Juju, a cadela comedora de palavras, percebo que os miúdos de hoje não podiam ser muito diferentes do que são: descarados. Tem piada enquanto têm 8, 9, 10 anos. Aos 15, 16, 17 deixam de ser descarados para se tornarem simplesmente ordinários. Agora há coisas que não entendo: Porque é que cona e caralho estão no dicionário e colhão não? Não está. Procurei e não estava.