2009/10/07

Mia Couto

O Carlos Vaz Marques entrevistou o Mia Couto para a Ler. Geralmente, os entrevistados têm direito à capa da revista. Até a Margarida Rebelo Pinto, essa grande escritora, teve tal honra. O Mia Couto não teve. Meteram lá o Bolaño. Outra coisa não se esperava. O Mia Couto é dos mais conhecidos escritores da língua portuguesa. A sua escrita, todavia, é desconsiderada por muitos. Acham-no cansativo, demasiado poético, uma linguagem cheia de trinados, de palavras imaginárias que são bonitas, na sua estranheza e exuberância, mas que não servem para nada. E maçam. A sua escrita está fora de moda. A escrita deve ser nos dias de hoje como o mobiliário do ikea. Minimalista. Depurada. Massificada. O bom gosto ao alcance de qualquer um. Como as estantes billy. Gosto do Mia Couto. Leio-o e sei que a casa do Zumbo continua à nossa espera. Natália, a menina que escutava canções do Roberto Carlos, também. A menina já é velha e tortinha. Anda esquecida. Não lembra o dia em que o homem indiano chegou e lhe arrancou o bebé dos braços. O Agualusa, lá de cima do seu sucesso, unânime e merecido, veio dizer que o Mia Couto cresceu. Eu, se fosse o Mia Couto, mandava-o dar uma volta ao bilhar grande. Para além do resto, que é muito, o Mia Couto é um homem bonito e não é nada fácil encontrar um escritor assim que escreva em português. Também por isso merecia ser capa da Ler.


(Correndo o risco da repetição, direi: a Ler é um revista feita por homens e para homens. Quem a faz nunca pensa nas mulheres e no bem que certas coisas nos fazem. Os homens, mesmo os intelectuais e eruditos, gostam de olhar para a maxmen e ver mamas e cus de silicone. As mulheres são diferentes. Também gostam da volúpia das mamas e dos cus de silicone das outras mulheres. Nos homens, todavia, procuram a beleza dos detalhes e o mistério do que é pouco evidente. Ora, tirando a capa do Agualusa e do António Barreto, uma mulher não se governa com a Ler. Um verdadeiro desconsolo.)