2012/05/04

El enanito (1)


O meu amigo anão telefonou-me a semana passada de Buenos Aires. Contou-me as novidades. Tivera sucesso na indústria pornográfica. A vida correu-lhe bem durante os primeiros tempos. Mas, depois, teve assim uma espécie de esgotamento, passou a ter dificuldades de hasteamento, custava-lhe muito a enrijecer o instrumento. Ainda lhe deram a tomar uns comprimidos a ver se a coisa se compunha. Porém, no momento da verdade, estava sempre de mangalho encolhido, uma serpente velha, sem serventia alguma. O realizador decidiu tirar-lhe o protagonismo. Meteram-no num filme de furry fandom, cheio de figuras híbridas; ele de figura secundária, usava uma bandolete de crina, calções justinhos de cabedal e botins a fingir de cascos de cavalo. A princípio, não se importou com a mudança: dava descanso ao seu monumental instrumento, estava para ali, só tinha de ser passeado por uma gorducha que usava um chicote com brandura; às vezes, relinchava. O pior é que os botins com forma de casco apertavam-lhe muito os penantes. Eram tão apertados que a determinada altura lhe pareceu que os pés encolhiam, passou a sentir tonturas e, constantemente, uma sensação de desequilíbrio durante a marcha. À noite, tinha pesadelos em que aparecia vestido de quimono, olhos rasgados de chinesinha, os pés minguando, minguando, cada vez mais pequenos, pés de lírio entrapados em sapatos de cetim vermelho. Percebeu que se continuasse a fazer de cavalgadura miniatura, a usar os detestáveis botins, em breve, deixaria de andar. Foi explicar ao realizador que não aguentava tamanhas dores, não estava para ser pónei a vida toda, a bandoleta ainda vá que não vá, agora as botinhas de casco nem pensar, ia-se embora. Julgou que o realizador reconsiderasse, lhe arranjasse outro papel, afinal o seu primeiro filme El enanito e las siete monjas peludas fora um sucesso. Um anão, melhor dizendo, um enanito como ele, tão bem apetrechado, não era nada fácil de encontrar.

Para sua surpresa o outro aceitou sem mais a sua demissão. As figuras híbridas já cansavam. Homens touros, centauros, harpias. Estava tudo visto. Era um entusiasta da cultura clássica, decidira fazer uma adaptação livre do asno de ouro e arriscava usar um burro a sério. Já tinha em vista um burro abissínio, raça de robustez provada, erecto, o burro abissínio era animal para ter um pénis com quase cinquenta centímetros de comprimento e vinte de diâmetro. Engoli em seco, confessou do outro lado da linha o meu amigo anão, bem vês, não é fácil ser-se ultrapassado por um burro. E continuou: ainda me senti tentado a pedinchar que me deixassem ficar, nem que fosse a tomar conta do asno, porém, depois lembrei-me de que um homem, mesmo sendo anão, tem o seu orgulho e por isso despedi-me. Estou sem trabalho há mais de dois meses. Volto na próxima semana. Pedia-me, se não fosse muito incómodo, para o ir buscar ao aeroporto. Pensei com os meus botões: estás nas lonas, por isso regressas, vens-me pedir batatinhas depois de me teres partido o coração, ah, meu bijouzinho malandro, a tua sorte é que eu sou uma mulher apaixonada, incapaz de guardar rancor! Não te preocupes, lá estarei para te ir buscar, disse-lhe e desliguei o telefone com o corpo cheio de alegria.