2010/09/27

Brilhante

De vez em quando, muito de vez em quando, sou contagiada pelo entusiasmo vibrante dos críticos, dos jornalistas, dos analistas. Aconteceu-me com o Brillante Mendonza. No último DocLisboa, o cineasta filipino mereceu uma retrospectiva. Os entendidos teceram, na altura, elogios maravilhosos ao tarantino asiático. Chamaram a atenção para a beleza crua, para a coreografia da câmara, para a estética única. Não resisti e comprei bilhetes para a tal retrospectiva. Vi-me enfiada num fim de tarde no auditório da culturgest, com um entrapado sentado ao meu lado que procurava intelectualizar as imagens que passavam no ecrã. Era um filme assumidamente pornográfico, passado numa casa de massagens de Manila. Um homem triste, acossado pela vida, era besuntado por rapazes miseráveis, uns magrinhos, outros entroncados, que falavam sempre alegremente. O filme não tinha grande história e a alegria despreocupada dos massagistas, pareceu-me, sinal de insuportável resignação. A resignação é um meio adequado para calar o desespero. Detestei, pois, o filme e arrependi-me amargamente de desperdiçar o meu tempo livre, tão escasso, com aquele documentário. O homem ao meu lado, pelo contrário, quando as luzes se acenderam, virou-se para um amigo da fila de trás, também ele entrapado, e iniciou uma maravilhosa conversa sobre o maravilhoso filme que tinha acabado de ver. Na altura, irritei-me com as trivialidades que os dois entrapados diziam embevecidos um ao outro. Porém, agora, quando penso melhor no assunto, não tenho dúvidas de que o homem apreciou o filme. Gemeu ruidosamente - juro, por tudo o que há de mais sagrado, que é a mais pura das verdades - durante a exibição. Tenho certeza que fez um esforço enorme para controlar as erecções do pénis. A verdade é que no fundo, bem lá no fundo, todos gostamos de pornografia.