2010/09/11

JL

Nunca compro o JL. Aborrece-me. Dedico a minha embirração mensal à revista Ler e aos textos de alguns dos seus cronistas. Esta manhã, porém, quando vi o JL pendurado por baixo da fiada dos jornais desportivos, não lhe resisti. Será, não duvido, interessante o artigo sobre a Clarice Lispector e reveladora a entrevista da ministra, sorridente, educada, disponível. Sempre enrolada nos seus lenços de cachemira. No entanto, foi a fotografia do José Eduardo Agualusa, na capa, que me levou a comprar o JL. A pose, vê-se, é ensaiada. O olhar é deliberadamente duro. Revela certo desdém. Os braços cruzados, tensos, grossos, mostram que a literatura é uma opção. Se quisesse poderia dar um pontapé nos romances e explorar o corpo. Trabalhar nas obras. Acarretar baldes de cimento. Assentar tijolo. Encontrar poesia nos andaimes e nas gruas. Qualquer coisa do tipo. Só deus sabe o quanto me embaraça fazer o papel da trintona desiludida, que se entusiasma com o que não existe. Antes o papel da suicida crónica. O desespero da tristeza pelo menos é um sentimento selecto. Exige sofisticação. Não é para todos. Já a felicidade é um sentimento pobre. Tem mesmo, parece-me, qualquer coisa de ordinário. Está ao alcance de toda a gente. Toda a gente é bestialmente feliz. Toda a gente vive num anúncio de telemóvel. Não conheço gente infeliz. Enfim, como dizia, aborrece-me ser um estereótipo de estafada banalidade, mas tenho de reconhecer aquilo que é óbvio: o José Eduardo Agualusa é giro que se farta. Até a minha frigidez, inquilina do meu corpo há tanto tempo, já bolorenta, bafienta, se encolhe quando o homem aparece. Uma mulher quer estar deprimida, deixar-se engolir pelo desespero, ser levada pela soturnidade - inesperada, mas bonita – deste Outono precoce, e não consegue…