2016/02/02

Rasgão

Enfio a mão e, com o dedo indicador bem espetado, procuro perceber o tamanho do rasgão. A repetição do gesto tem consequências óbvias: aos poucos, o buraco do bolso esquerdo do meu casaco preto vai aumentando. Suponho que no fim do Inverno o rasgão será de tal forma grande que, quando a enfiar no bolso, a minha mão não terá apoio, ficará suspensa na escuridão do avesso do meu casaco preto. Como um corpo baloiçando à beira do precipício. Hoje, na Praça de Londres, depois de sair do consultório do psiquiatra, apanhei cinco minúsculas pinhas do chão. Caídas dos cedros, as pequenas pinhas, com os seus buraquinhos simétricos, banhadas de luz e esquecidas no ruído da cidade,  maravilharam-me ao ponto de ficar parada no meio da rua a olhar para elas. Apanhei-as, cheirei-as e, uma a uma, enfiei-as pelo rasgão do forro do bolso.