2008/03/12

Folhado de salsicha

Logo pela manhã, ainda os bolos se apresentavam frescos nas vitrinas, falava a Lurdes da cafetaria com a menina Fátima da farmácia sobre a situação interna do Benfica. Dizia a Lurdes, que tem a voz baça, engrossada pelo fumo de milhões de cigarros, que o problema não é o treinador, até podia vir o Mourinho, nem os jogadores, o problema é a cambada de dirigentes que não tem uma política de rigor para o clube. Enquanto falava, a Lurdes manuseava com uma pinça os folhados de salsicha, dispondo-os em pirâmides, mesmo ao lado das empadas de galinha e das meias-luas de legumes. Via-se, pela tensão acumulada nos cantos da boca, rija, tesa, como um pedaço de cortiça, que a crise do Benfica a perturbava ao ponto de a fazer trocar os pedidos. Trouxe-me uma torrada aparada em vez do pão com manteiga que lhe pedi. A menina Fátima, que é belfa, escutava-a em silêncio, tão feia na sua bata branca, admirando o conhecimento profundo da outra sobre os assuntos da actualidade desportiva. Eu, se fosse uma mulher de coragem, saltava para o outro lado do balcão, amarrava a Lurdes com o fio cor-de-rosa que usam para atar as caixas dos bolos de aniversário e enfiava-lhe um folhado de salsicha pelos gorgomilos abaixo.