2011/03/29

Branco

Sou praticante do voto em branco. Não voto por exclusão de partes, nem para penalizar outros candidatos, nem congeminando cenários futuros para apurar a utilidade do meu voto. Voto quando acredito nas ideias de alguém, quando tenho esperança na sua coragem, capacidade de análise e decisão. Nos últimos anos, que me lembre, votei duas vezes. A primeira vez foi nas legislativas de 2002. Foi uma escolha desastrosa. Durão Barroso cedeu à sua vaidade pessoal. Demitiu-se para ocupar o cargo de presidente da comissão europeia, defraudando, de maneira um bocado abjecta, o voto de quem, como eu, nele votara. Senti-me, na altura, como uma esposa dedicada, traída, trocada por uma boazona de tetas siliconescas. A segunda vez que votei foi nas legislativas de 2009. A Manuela Ferreira Leite, competente e austera, pareceu-me a pessoa certa para tomar conta disto. Depois, sendo mulher, apelava ao meu feminismo. É superior às minhas forças. Acredito genuinamente na superioridade das mulheres. Foi também uma má aposta. Foi uma escolha solitária. O país preferiu manter o regabofe, caminhar com alegria para o precipício.

Perante o cenário de eleições antecipadas, incomoda-me voltar a votar em branco. O momento é decisivo. Mas, por muito que me esforce, não serei capaz de votar neste PSD e neste líder. Há nele uma vacuidade imensa, muita delicadeza, uma permeabilidade que me assusta. As companhias não são recomendáveis. A título de exemplo, um dos vice-presidentes é o Marco António, figura meteórica do partido, vereador, deputado, secretário de estado, administrador de várias empresas municipais do município de Valongo, um currículo tão típico quanto demonstrativo daquilo que é e quer da vida política. Ora, o André Freire contava ontem no Público que o tal Marco António terá acicatado o líder, explicando-lhe que, de duas, uma: ou tinha eleições no partido ou no país. Uma pessoa lê uma coisa destas e chega-lhe um frio na espinha que se espalha pelo corpo e se aloja no vazio dos ossos. Votaria em alguém que fosse capaz de governar contra o seu partido, a favor dos portugueses, sabendo que governar a favor dos portugueses é, neste momento, governar contra a vontade dos portugueses. Parece óbvio, no entanto, que nem o Passos Coelho será capaz de governar contra o partido, nem deixará de cair na tentação de governar com falinhas mansas, tratando os portugueses, como é prática habitual, como débeis mentais a quem se mente para conseguir meia dúzia de votos. Estou fadada a continuar a votar em branco, o que me chateia profundamente, sobretudo pela dificuldade de explicar aos meus filhos mais velhos a minha decisão.