2009/06/04

Lista

Há um movimento. Há um propósito. E há, pelos vistos, uma lista de gente que apoia o dito propósito. São actores, jornalistas, juristas, biólogos, comentadores, deputados, escritores, cantores, estilistas, fotógrafos, encenadores, curadores de museus, bloggers, ensaístas, poetas, sociólogos, investigadores. A lista vai por aí fora e tem o mérito da extensão. São muitos. Mas a lista é também previsível e imensamente aborrecida. Está lá, como sempre acontece quando se fala das tais questões fracturantes da sociedade, a nata bem pensante, a elite dos iluminados, os privilegiados que opinam, as vedetas de fancaria que tratam estes assuntos com a mesma vacuidade que imprimem às suas vidas. Eu, que sempre defendi o casamento entre pessoas do mesmo sexo e que, no dia da mãe, até mereci uma canção feita pelo meu filho sobre o assunto (tal é a lavagem cerebral a que o pobre é submetido), torço o nariz, o monumental nariz que deus me deu, a um ajuntamento tamanho de gente tão ilustre. Perdoem-me a franqueza, não levem a mal o meu enfado, sei que o assunto é sério e merece elucubrações com mais tino, mas a lista é assustadora. Desconfio que, pelo meio, também há-de lá estar a Bárbara Guimarães e o Luis Represas. É verdade que há muitos anónimos na lista, mas a esses ninguém liga. Não merecem uma referência, muito menos uma categorização. Gostava de uma lista mais terra a terra, feita de gente comum: pedreiros, padeiros, empregados de balcão, coveiros, trabalhadoras do sexo, operadores de call-center, posticeiros, canalizadores, empregadas domésticas, bancários, gestores de condomínios, motoristas da carris, instrutores de artes marciais, revisores de comboios, analistas informáticos, calistas, manicuras, auxiliares protésicos. Isto é que era uma lista. Uma lista assim e seria inegável a robustez e a força do movimento. Uma lista assim e seria inegável que a sociedade de carne e osso quer e aceita o casamento entre pessoas do mesmo sexo.


(Entretanto, a Ana Zanatti, na sessão de apresentação do movimento, assumiu-se como lésbica. Sem querer menorizar o gesto, parece-me que o mesmo era desnecessário. Ainda eu não sabia bem o significado da palavra lésbica e já sabia que a Ana Zanatti o era. Via-a na Vila Faia e escutava a minha mãe bichanar ao ouvido da minha tia que ela e a Lara Li tal e coisa. Toda a gente sabe, há muito tempo, que a Ana Zanatti gosta de mulheres. O ter-se assumido como lésbica é uma novidade com cheiro a mofo. A ranço.)