Porém, a possibilidade de uma mulher no futuro poder abortar até às dez semanas num hospital público, com a assistência médica devida, não me faz dar pulos de alegria. Até porque não resolverá a maior parte dos problemas. As adolescentes continuarão a foder cada vez mais novas com rapazes de brinco que têm pit-bulls e querem ser parecidos com o Cristiano Ronaldo. Continuarão, sozinhas, a ter os seus filhos, apavoradas por confessar a gravidez aos pais. As mulheres da Maia e as de Aveiro, que convenientemente (sobretudo os jornalistas) toda a gente esquece que abortaram depois das dez semanas, continuarão a ser julgadas porque a lei continuará a criminalizar quem o faça a partir dessa data. As senhoras da classe média e da classe média-alta, que têm dinheiro, não se submeterão a uma interrupção da gravidez num qualquer hospital público. Continuarão a ir às clínicas de Espanha e Inglaterra onde poderão abortar com comodidade e discrição. Mas a verdade é que há mulheres, muitas, que têm uma vida difícil, amachucada, sofrida. Não merecem sofrer mais. Seja impondo-lhes um filho que não desejam. Seja empurrando-as para um aborto clandestino. Seja com a condenação de uma sociedade que, em nada, as ajuda. É por estas mulheres, só por estas, que votarei sim. Porque se as que vão a Badajoz e a Londres têm liberdade de escolher ter ou não um filho e têm a possibilidade de o fazer em segurança, com todas as mesuras e cuidados, o Estado, o tal que se apregoa de Direito, tem de garantir o mesmo às demais, sob pena de inadmissível violação do princípio da igualdade.