2006/12/11

Pinochet

Morreu o Pinochet. As notícias anunciam os festejos da sua morte. Não rejubilo com a morte de ninguém. Os ditadores, em regra, não passam de seres patéticos que me suscitam mais pena do que ódio. Apesar de não festejar a sua morte, reconheço - claro que reconheço ! - que o general não fará cá falta nenhuma. Uma das primeiras sovas que levei do meu pai foi quando celebrei a vitória do não no plebiscito realizado no Chile. Foi há muitos anos, oitenta e oito ou oitenta e nove. Lembro-me de estar no quarto dos meus pais, encolhida a um canto, perto da janela, a levar tabefes. O meu pai espumava da boca. Batia-me, com fúria e desprezo, por causa do ditador sul-americano que acabara de ser afastado pelos chilenos. Insultava-me, chamando-me comunista e outras coisas que ainda gosta de me chamar. Lembro-me de desviar o olhar para uma fotografia pousada em cima da cómoda, em que a minha irmã, concentrada, escrevia num caderno de capa verde. Mais do que de atrocidades que fez ao seu povo, confesso, sempre guardei rancor grande e antigo ao General por causa do ódio que nessa tarde vi nos olhos do meu pai.