2007/08/07

Besouros

Estou na fila do refeitório, mesmo ao lado do balcão das sobremesas de plástico. Gelatinas de pêssego, bavaroises de morango, tartes de maçã, tortas de chocolate com cobertura de coco. Na televisão passa uma reportagem sobre as demolições na azinhaga dos besouros. É, então que, vinda de trás, chega uma voz. Estes pretos vêm para aqui fingir que trabalham, põem-se a construir onde não podem, depois levam com os catrapilers em cima. Azar! Viro-me. Quero ver as feições de quem, com tamanha jactância, se manifestou. Vejo uma rapariga de casaco azul escuro e blusinha cor-de-rosa. Tem feições duras. Feias e suburbanas. Tem feições de quem nasceu na Bobadela, em Mem Martins ou na Abóbada, de quem tirou o curso na Lusófona e chamará Beatriz à filha feiinha que terá daqui a meia dúzia de anos. É gestora quase de certeza ou economista ou informática ou qualquer coisinha assim. Tem ar de quem nunca foi devidamente fodida. De quem nunca será devidamente fodida. Enquanto a observo de alto a baixo, penso assim: vai para a puta, escancarada, enorme e malcheirosa que te pariu. Penso. Mas não digo. E tenho pena de não dizer. Gostava de ser capaz de verbalizar os meus insultos. Não me faz nada bem guardá-los para dentro.