2007/11/14

Torre

Levantei-me às 6.30 para ir correr. Cruzei-me com pescadores, com dois polícias, com um casal que caminhava de mãos dadas, com um homem jovem e alto, de pernas torneadas, que passou por mim como se fosse uma gazela ou um foguete. Perto da torre, alta, branca, ovnidea, passei por uma mulher gorda que passeava um cão preto, enquanto fumava um cigarro. Olhei-a de viés. Vestia um oleado castanho, tinha o cabelo hirsuto, muito despenteado e olhos pequeninos de animal. Quando por ela passei, achei o seu rosto familiar. Enquanto corri, tentei lembrar-me de onde é que a conhecia. Só perto do oceanário me lembrei. Marta. Chamava-se, e continua a chamar-se, Marta. Fomos colegas no liceu. Era uma figura triste da escola. Amava loucamente um rapaz de olhos verdes, cheio de caracóis, levemente idiota, chamado Marco, que não se dignava sequer a dirigir-lhe a palavra. Escrevia-lhe poemas, sonetos, verdadeiras elegias ao amor e à paixão. Apanhei secas monumentais na paragem do 19 a ouvi-la declamar os poemas que escrevia ao tal Marco. Acho que também tirou Direito. Está gorda. Foi por isso que não a reconheci. Fiquei imediatamente feliz. Gosto de encontrar os meus antigos colegas de liceu e descobrir-lhes banhas, celulite, rugas, cabelos brancos e ralos, barrigas de cerveja, outras de inacção. Gosto de olhar para elas e pensar que devem usar para aí o quarenta e dois. Gosto de olhar para eles e pensar na figura patética que fazem quando, pela noite, se despem para as suas amantíssimas esposas.