Chama-se Amália. Conta o meu pai que, quando eram pequeninos, a levava na bicicleta para a escola, percorrendo vários quilómetros de caminhos enlameados e tortuosos, debaixo das chuvas monótonas das monções. Quando cresceu, a tia Amália tornou-se professora e, como todas as outras raparigas goesas, casou com o homem que os seus pais, meus avós, escolheram para si. Xavier, um funcionário de uma fábrica qualquer, a quem acabou por amar. O meu pai, pouco dado a elogiar os seus, tem uma admiração grande por esta irmã. Apesar de pertencer a uma família brâmane, a tia Amália casou a filha com um rapaz de outra casta qualquer. Marimbou-se nas ancestrais tradições e ficou contente por a filha, médica, casar com um engenheiro trabalhador que a levou para a Arábia Saudita, onde ganham rios de dinheiro e são felizes. Esta atitude não é comum na comunidade católica goesa, muito apegada aos valores tradicionais. Quando o meu tio Rosário casou com uma mulher de uma casta inferior, a minha avó, para o castigar, mandou construir-lhe uma casa na periferia da aldeia, longe de si e do resto da família e, para sempre, o tratou como um pária. Morreu de cirrose, carcomido pelo álcool e pelo desprezo familiar. O meu pai só levou a minha mãe a Goa depois da avó Aninhas morrer. Parece que ela apanhou uma fúria grande por ele, preterindo a noiva goesa por ela escolhida (feiíssima, segundo consta), ter casado com uma portuguesa. Coitadinha da minha avó. Ficou a ganhar o meu pai que casou com a mulher mais bonita do mundo. Ainda hoje me custa a perceber como conseguiu o meu pai seduzir a minha mãe.