2006/11/24

A1

Sentia o trepidar do carro cada vez que um camião passava. E a chuva era assim como a de hoje. Indomável, baça, furiosa. Sentada no carro, contava os minutos no relógio. Comi uma barra de chocolate que se desfez e deixou nódoas esboroadas na saia de fazenda castanha. Os camiões lá fora continuaram a passar como elefantes durante muito tempo. Perguntava-me a mim própria como pudera o pneu rebentar, assim, num final de tarde de Inverno, no meio de uma tempestade, na auto-estrada do norte, longe de tudo, de todos, com a chuva a fustigar por todos os lados. Vi-me só e a solidão, pela primeira vez na minha vida, assim tão concreta, com corpo de chuva, assustou-me. Até que olhei pelo espelho retrovisor e te vi. Risonho como um animal manso, enfiado numa gabardina verde. Naquele instante, naquele preciso instante, gostei tanto de ti.