2006/11/17

Amadora

Volto a encontrar a anã das rifas. Na estação de comboios. Já não anda a fazer de coitadinha. Desenvolta, mancando, com uns sapatos de sola grossa que lhe dão mais meia dúzia de centímetros, caminha na minha direcção. Fuma uma cigarrada. O olhar já não é de comiseração. Não pede piedade, nem esmola. Passa junto a mim. Fala sozinha. A voz também não é igual. É uma voz demoníaca, malévola, de gnomo mau. Ri-se em ih, ih, ih, em vez de ah, ah, ah. Esta anã, imagino, deve ser dada a magias negras, a vícios, a cambalachos, expedientes vários. Se calhar é, até, o fetiche sexual de alguém. Já estou a vê-la a gastar o dinheiro das rifas para comprar chicotes e fatos de cabedal. Volto a olhá-la. Atira com a beata para o chão e, muito tortinha, tal qual um caranguejinho perneta, entra no comboio que vai para a Amadora.