2006/10/02

Frio

Está frio. Tirito. Apetece-me comer marmelos cozidos com pau de canela. A tia Dé, que tem a solidão aberta nos olhos e nos dedos, fá-los bem. Se um dia me morre a tia, a mãe ou o pai morro também. Mato-me que não me quero por cá sem progenitores. Sou mais filha que mãe. Quero ser outra vez menina para ver as trovoadas da janela da cozinha da minha avó. O nariz pingão esborrachado no vidro. A imaginar deus como um mago gigante, fero, vestido de cetim recamado de estrelas e cometas, a lançar feitiços cá para baixo. Agora sou crescida. Sou uma mulher crescida e gelada. Vou para casa enrolar-me em folhas de papel de jornal. Depois acendo um fósforo. Pode ser que aqueça.