Na peixaria, enquanto espero que a senhora de avental e da touca arranje as postas de safio, vislumbro um vulto pequeno que se aproxima do homem que está ao meu lado. É uma anã. Ou politicamente falando, uma pessoa de estatura pequena. Traz um bloco de folhinhas amarelas nas mãos anquilosadas. Escuto. “ ... e depois lembrei-me, em vez de pedir esmola, faço umas rifas e …”, ouço-a dizer com voz de falsete. Olho-a de viés. Toda a gente a olha de viés. O que nela incomoda não é a pequenez, nem sequer a feiura, que é muita. O que chateia, e surpreende, é o tom que põe na voz. Faz lembrar um fantoche ou o boneco de um ventríloquo. Tem a lengalenga decorada. Sou interrompida pela minha filha que, aborrecida, me pergunta porque é que levo safio em vez de dourada. Gosto mais de doirada, diz ela, que se deixa encantar por tudo o que brilha, até pelos nomes dos peixes.