A propósito do dia de hoje, o Público fala de mulheres trabalhadoras com filhos. Chama-lhes super mulheres. Na minha ingenuidade, pensei que o Público abordasse efectivamente a situação das mulheres que têm de trabalhar e cuidar dos filhos. Enganei-me redondamente. O Público limita-se a descrever, de forma aborrecida, a vida de duas ou três mulheres, bem sucedidas profissionalmente, repimpadas nas suas vidas, que gostam de parir como coelhas (espero, sinceramente, espero que, pelo menos, também gostem de foder como coelhas). Há uma tipa qualquer que pôde deixar de trabalhar porque o marido tem “uma óptima posição” na sociedade de advogados onde trabalha. Faz de motorista. Ao fim do dia é uma canseira. Tem de ir buscar as crianças à escola e andar, de um lado para o outro, a distribuí-los nas actividades. Esta tipa é uma super mulher? Há outra, com uma catrefada de filhos, é certo, mas com duas empregadas e uma equipa de babysitters e avós para a ajudar. É esta uma super mulher? Sem cair no discurso do politicamente correcto (eu sei que agora está fora de moda o politicamente correcto, aliás, agora é politicamente correcto ser-se politicamente incorrecto), digo: super mulheres são as senhoras da limpeza, os rostos precocemente marcados com sulcos profundos, as mãos gretadas, o cheiro da catinga entranhado no corpo, que entram no edifício quando eu saio ao fim do dia e o abandonam pela manhã quando eu chego. O edifício espreguiça-se em movimentos lentos e expulsa o cansaço destas mulheres. Eu olho para elas e pergunto-me sempre quando é que dormem.
(E, se alguém se atrever a entregar-me uma florzinha, murcha e desengraçada, arrisca-se a levar com ela na cabeça.)
(E, se alguém se atrever a entregar-me uma florzinha, murcha e desengraçada, arrisca-se a levar com ela na cabeça.)