2007/05/29

Dálias

Herdei da minha mãe o feminino deslumbre pelas jarras com arranjos barrocos, pelas plantas que crescem em vasos, pelos arbustos com cheiro de infância, pelas estufas, pelas floreiras com gerânios descarnados nas varandas, pelas árvores, pelos jardins, pelas mãos enterradas na terra. Gosto de ter a casa florida. Por isso, de quinze em quinze dias, vou ao cemitério dos Olivais comprar flores. A florista dá-me sempre um raminho de vivaz para compor as jarras dos cravos. Estranha que compre apenas um gladíolo e, também, o horror que tenho à maior parte das flores que vende. Margaridas, coroas imperiais, gerberas. Impacienta-se quando me queixo da ausência total de dálias nas floristas de Lisboa. Não há filha! As dálias não crescem em estufa!, explica enquanto ajeita as pequenas coroas de flores de plástico em forma de coração. Aquelas coroas de plástico, contou-me certa vez, têm muita saída. São mais baratas, resistem ao sol, à chuva e ao vento. Às vezes atravesso o portão. Passeio entre túmulos e campas. Espreito as fotografias em tom sépia dos defuntos. Leio os dizeres cheios de amor e eterna saudade dos familiares. É fácil amar os mortos.Os ciprestes que, se perfilam junto ao muro, guardam o silêncio do cemitério.