2011/06/27

Havana

Almoço na esplanada do centro budista da rua D. Estefânia. Tenho por companhia a única amiga da faculdade que me resta. As outras, fui-as perdendo à medida que fui tendo filhos. Um gato preto espreguiça-se, molengão, por baixo de um estendal de roupa velha, esgaçada pelo uso. Ao fundo, as ruínas de um edifício austero, um asilo, um hospício, erguem-se como um gigante furioso. Lembro o sonho desta noite. Voltei a sonhar com a minha morte. Fico ao corrente da vida de quem não me interessa. Gente que não vejo há quinze anos. Tomo consciência de que, do grupo da faculdade, fui a primeira a separar-me. Serei, porventura, por enquanto, a única. Essa vantagem conforta-me. Entre outras coisas, fico a saber que um dos meus pretendentes da faculdade - tive dois: um, socialista, pouco asseado, porco mesmo, patologicamente mentiroso; o outro, conservador, dado a fados, touros e putas - é um homem de sucesso. Acaba de comprar o seu primeiro carro de luxo, um porshe, e está a ponderar comprar uma casa em Havana por apreciar a vida nocturna, os mojitos e daiquiris, as mulheres que se compram. Emociona-se com a decadência do socialismo cubano. Ainda não sei muito bem o que sentir em relação a isto. O que sinto em relação a isto? Não sinto nada. Não sinto sequer nojo ou alívio. Dispenso o porshe e a casa em Havana. O que quero é um homem com sentido de humor.

(Por que é que as mulheres, quando instadas a se pronunciar sobre as qualidades que apreciam no sexo oposto, afirmam que o que procuram é um homem com sentido de humor? Que utilidade tem um homem com sentido de humor? Para que serve? A maior parte das mulheres raia a imbecilidade. Eu, quando quero rir, escuto a Maria de Medeiros cantar, oiço as entrevistas do João Marcelino ou leio as análises do António Perez Metelo.)