Sentada na sanita, estico o braço para abrir a porta do armário onde guardo cremes, loções, pensos higiénicos, escovas, os sabonetes de açafrão e sândalo que a minha mãe trouxe do mercado de Goa. Tiro um penso higiénico. Está dobrado em três, dentro de um rectângulo de plástico azul-escuro. É um penso bastante comprido, reforçado, com abas largas; quando o aproximo do nariz larga um leve cheiro asséptico. Há já alguns meses que tenho de usar estes pensos enormes. Passei a ter um fluxo abundante, hemorragias torrenciais, diluvianas, causadas, segundo me explicou a médica bailarina, por um mioma com três centímetros de diâmetro. Durante o duche, se estou menstruada, escorrem de mim grandes coágulos escuros, cor de amora, que se assemelham a lagartas e rapidamente desaparecem pelo ralo da banheira. Com um gesto brusco arranco o penso sujo das cuecas e enrolo-o no plástico azul-escuro.
Leio durante algum tempo, depois adormeço.
Leio durante algum tempo, depois adormeço.
Acordo a meio da noite para ir comer (há cerca de dois anos que sofro desta estranha forma de parassónia; acordo três, quatro, cinco vezes durante a noite e, num estado semi-inconsciente, devoro alimentos calóricos de sabor excessivo: os cereais dos miúdos, a nutela dos miúdos, as bolachas dos miúdos). Ao abrir a luz reparo nos lençóis tingidos de vermelho. São várias manchas de um vermelho aberto, muito vivo. Fico durante alguns instantes a olhar para a cama, sem saber muito bem o que fazer. Parece que alguém entrou no quarto e, sem eu dar por isso, de forma eficaz e indolor, me esfaqueou várias vezes. Atordoada, apalpo o corpo à procura de uma qualquer ferida que justifique aquele sangue todo derramado nos lençóis brancos da minha cama. Só depois me lembro de que estou menstruada. Continuo a olhar para os lençóis da cama. Não sinto repulsa, nem nojo, nem sequer estranheza. Afinal, é apenas o meu sangue.