2007/07/02

Lebres

Passam velozes. Como se fossem gazelas ou lebres. Solitários ou bafejando em manada. Touros, bisontes, bois almiscarados. Olho-os. Um rapaz negro passa, correndo por cima do muro que nos separa do rio. Movimenta-se na perfeição. O seu corpo de ébano é uma máquina eficaz. Os homens têm elegância a correr. Quando correm, em passadas largas, e pesadas, quase sinto o rio tremer. Já as mulheres correm mal. A maior parte não sabe correr. Terão certamente corrido em meninas. Desaprenderam, depois. Metem os pés para fora. Enrijecem os braços, não sabendo o que lhes fazer. Abanam a cabecinha como se fossem aqueles cães articulados que, entre almofadas de renda, se colocavam na parte de trás dos automóveis. Bufam como vacas. Quando são gordas, abanam as mamas, as carnes flácidas, transpirando uma gordura quente e amarela que se espalha por todo o lado. Um homem gordo corre como um touro, um rinoceronte, um elefante até. Uma mulher gorda corre como uma perua imensa, soltando gorgolejos insuportáveis. Glu-glu-glu-glu. Por vezes, tento imitar os homens-lebre. Acelero um pouco o ritmo. Corro mais depressa. Aumento a passada. Dou balanço. Desisto pouco depois. Corro o risco de morrer junto ao rio. Nunca serei uma lebre. Sou uma tartaruga. Vagarosa. Velha. Tenho mais de cem anos. Corro com passos pequeninos. Mas corro muito. Olarila. E chego sempre à meta.

(ando desconfiada que sou uma pessoa amarga.)