2007/07/17

Tebaldo

Durante três horas o homem roncou. O bravo Tebaldo a agonizar no palco e ele ao meu lado a dormir profundamente, prolongando o ronco até ao insuportável, acordando volta e meia, engasgado, para dar uma tossidela ou duas, cof-cof, depois voltando ao seu sono ruidoso de homem velho. Durante três horas o homem roncou. As pessoas da fila da frente voltaram-se indignadas. A mulher, do outro lado, beliscou-o várias vezes. Do balcão chegou mesmo um chiu feroz. Mas nada incomodou o grande roncador. No intervalo, explicaram-me que é psiquiatra, uma sumidade na sua área. Parece que é um espectador assíduo. Vai, com frequência, a concertos de música clássica, a espectáculos de teatro e ópera. Ressona alarvemente em todos. Um fio de baba escorrendo-lhe da boca. Desejei ardentemente que o bravo Tebaldo, tão bonito, saltasse do palco e que, com um golpe certeiro, lhe enterrasse a lâmina na carne, calando-o para sempre. Mas nada. Nem Tebaldo, nem Mercúrio, nem o sonso do Romeu, se mexeram. Uns palermas. Durante três horas o homem roncou. Quando o espectáculo terminou acordou sobressaltado. Depois levantou-se e, com alarido, aplaudiu. Até gritou um bravo. Como é bom ir ao teatro.