Hoje, quando a vi, estava com o marido a falar com uma mulher mais velha, que fazia gestos largos e dava gargalhadas ruidosas. A Carla e o marido, embevecidos, abraçados, entrançados, como se fossem só um corpo, escutavam-na. As mãos gordas e sapudas da Carla a fazerem festas nas costas do marido. Porra. Fiquei logo enjoada com aquilo. Como é possível que, passados tantos anos, ainda façam as mesmas figuras que faziam no liceu? De certeza que ela continua a fazer beicinho e a tratá-lo por "mor" que é a maneira mais – como dizê-lo?- merdosa de se dizer "amor". Como é possível que continuem a comportar-se como se fossem as pessoas mais felizes do mundo? Enervou-me, já me enervava no liceu, tanto amor, tanta compreensão, tanta cumplicidade. Não há pachorra para quem é feliz. Detesto a felicidade dos outros, principalmente a felicidade cor-de-rosa choque, feita de sorrisos babosos, de lugares comuns, de frases feitas, repetidas, previsíveis. Imaginei-os na cama. Ele, muito excitado, com uma pila pequena e fina, muito direita, o cabelo penteadinho, com as cãs já grisalhas, a cavalgar, furioso, como se fosse uma pulga frenética, em cima daquele corpo imenso, branco, paquidérmico, insuportavelmente níveo, cheio de banhas e de celulite. Pior, imaginei a Carla a ter um orgasmo, aquela boca de beiços grandes a gemer, a arfar, os olhos a revirarem-se como espirais e a dizer baixinho "oh...mor...anda... anda…vem...". Estou mal disposta desde então. Com essa terrível imagem. E com a hipótese da rainha de copas, ao contrário da minha álgida pessoa, ter orgasmos de jeito. Grandessíssima puta.