2015/04/02

Ciprestes

Os ciprestes parecem fazer pontaria unicamente para a campa do João Pedro. Ao contrário das outras campas, a dele está sempre cheia de caruma perfumada, também de umas bagas de polpa pegajosa que se aninham no rebordo da lápide. Aprendi há pouco porque se plantam estas árvores em cemitérios. Tesos e esguios, representam o duelo entre a vida e a morte, aguentam invernias sem perder o viço da folhagem, têm o cheiro da santidade, de genefluxórios encerados, simbolizam a vida eterna. Não sou entusiasta de vivências místicas,  mas na insólita pontaria dos ciprestes para a campa do João Pedro vejo uma manifestação divina, um sinal de eleição, de imortalidade e ressurreição. Sorrio por isso quando chego ao cemitério e me apercebo da campa cheia daquelas bagas cerosas. Sem perder tempo, na minha saudade zelosa, pego na vassourinha de estopa e apresso-me a varrer os pequenos bugalhos.