Pensei na mão de dedos esguios entrando lentamente pela janela do carro. Masturbei-me como nunca antes o fiz, sem me fechar, sem sentir vergonha, sem sufocar, aceitando o meu corpo no seu vagar e mistério. Tive um orgasmo e depois outro. Senti-me pura, iluminada por um sol novo. Levantei-me e fui fumar para a varanda. Um sorriso tolo parecia estar colado à minha cara, tentei uma expressão séria, mas o sorriso continuava preso aos maxilares. Como se tivesse fumado um charro. Voltei para o quarto e deitei-me. Pela primeira vez depois do divórcio, em vez de acantonada a um canto, adormeci bem no meio da cama.
Ontem, depois do apartamento sossegar, deitei-me a ler. Lia, mas era como se não lesse, as personagens andavam pelas páginas como espectros, incapazes de captar a minha atenção. A lembrança da noite anterior não me largava. Ansiava pelo momento em que, apagada a luz, na penumbra, o meu corpo renascesse. Foi então que escutei passos familiares no corredor. Soube logo que era o mais pequeno, tem um modo de caminhar característico, a sua passada é acelerada e saltitante, parece um anãozinho torto a pisar um chão de cinzas incandescentes. Mal chegou mostrou os braços cheios de babas de mordedura de um mosquito. Peguei no meu filho ao colo e sentei-o na bancada da casa de banho. Coloquei-lhe fenistil nas pequenas borbulhas, dei-lhe beijos, falei-lhe com ternura. “Posso dormir contigo, mãe?”, acabou por perguntar, sabendo de antemão a resposta. Levei-o para a minha cama e esperei que adormecesse. Enquanto o observava, acantonada a um canto, recordei a pietá que encontrei na Igreja de São Domingos.