No Pingo Doce do Parque das Nações, mesmo em frente do talho, à boca do corredor dos detergentes, há um pequeno escaparate com livros. Entre obras de Jodi Picoult, Júlia Pinheiro e Pedro Chagas, costuma estar também um exemplar do último livro do José Luís Peixoto. É lá, no Pingo Doce do Parque das Nações, enquanto dou instruções ao talhante vesgo - “ Deixe as miudezas, tire a cabeça e corte o coelho aos pedaços.” ou então “Quero uma perna de peru, mas, por favor, desossada.” -, que, aos soluços, tenho lido o último livro do José Luís Peixoto. A virgem e os pastorinhos. Os pastorinhos e a virgem. É uma leitura adequada para quem espera. Ligeira, irrelevante, sem chegar a ser propriamente desagradável. Às vezes, porém, interrompo a leitura para olhar a vitrina e as bancadas onde as carnes são arranjadas. Não percebo de cortes de carne, não sei avaliar se a carne que o rapaz vesgo me dá é boa ou má, mas gosto da sua luva de malha metálica, do ruído de facas e cutelos, de certos vermelhos desmaiados.