2006/10/27

Felicidade (1)

Soube da morte de uma vizinhas da minha avó. A Idalina. Melhor dizendo, a vizinha Idalina. Era assim que toda a gente a chamava. Vizinha é uma espécie de título. Assim como há por esse mundo fora condessas, duquesas, rainhas, viscondessas, marquesas, há nas aldeias vizinhas, tias e comadres. A vizinha Idalina morava mesmo em frente dos meus avós, numa casa com arcos, quase tão feia como a nossa, pintada de salmão, com um lambrim de azulejos acastanhados e brilhantes. Estava sempre por ali. Eu saia e dava de caras com ela, sorrindo-me do outro lado da rua. Masculina. Com o cabelo encaracolado. Vestindo batas coloridas. Regando os canteiros rectangulares onde cresciam dálias cor-de-vinho. Agora, quando voltar, ela já não estará lá. Não voltará a regar as dálias, nem as cristas de galo, nem as alegrias do lar. Não pegará na mão da minha filha e não a levará mais até ao fundo do quintal, perto das capoeiras, para lhe mostrar ovinhos de codorniz.