Apetece-me o silêncio. Mas o silêncio é um bicho raro, em vias de extinção, não se encontra em sítio algum. Está fora de moda. O dia está cheio de ruído. Letras que copulam, furiosas, até formarem sílabas, sílabas que formam palavras, palavras que constroem espirais de frases, frases que alicerçam diálogos. Tamanho desperdício de palavras, escritas e faladas, desespera-me. As palavras são como a água. Como as jazidas de petróleo, urânio, carvão. Meios escassos não se desperdiçam. Sempre ouvi dizer. Gastamos tanto as palavras que elas correm o risco de perder o seu significado. É no silêncio e na ausência que as pessoas se encontram. Mas a noite também não traz silêncio. Vem com o frenesim dos pássaros nocturnos. Piam as aves em estranhas sinfonias, batem as asas, espalham o pó das árvores sobre o mundo. A noite vem com os murmúrios do desejo alheio. Quero-te. Abraça-me. Toca-me. Vem com o desaguar manso das lágrimas das mulheres traídas nas almofadas de poliéster. Vem com o barulho pesada das páginas que volto. Vem com o cri-cri dos grilos que habitam o jardim. Vem com os ruídos cansados das entranhas deste prédio. E com as gargalhadinhas lépidas das meninas dos anúncios de telemóveis que vivem nos sonhos dos homens. A noite é malvada. Má. Má. Má. Traz os ruídos dos sonhos. Os sonhos, os meus, com escadarias de musgo, corredores sombrios, palácios de papelão, cansam-me. Dão cabo de mim. Preciso, com a urgência tola dos tolos, de silêncio. Não o encontro.
(Voltei sem vontade de escrever. Os textos das últimas semanas são, quase todos, textos antigos, de outros diários, de outros cadernos, de outros blogs. Fica o desnecessário esclarecimento. Para que não se estranhe o silêncio quando ele, por fim, chegar.)
(Voltei sem vontade de escrever. Os textos das últimas semanas são, quase todos, textos antigos, de outros diários, de outros cadernos, de outros blogs. Fica o desnecessário esclarecimento. Para que não se estranhe o silêncio quando ele, por fim, chegar.)